O rap tomou conta do Campão Cultural nesta noite de sexta (14). O carioca MV Bill, um dos grandes nomes do estilo no Brasil, trouxe suas letras de protesto para o palco Esplanada, reunindo um público dedicado que cantou músicas como Insalubre, Estilo Vagabundo e Favela Vive.
O rapper é conhecido não só por sua produção musical, mas também por seu papel como ativista social. Ele foi um dos criadores da Central Única das Favelas (CUFA) e, dentre diversos prêmios, foi considerado pela Organização das Nações Unidas (ONU) como uma das dez pessoas mais militantes no mundo na última década. MV Bill faz parte de uma turma mais antiga de rappers brasileiros e é uma referência no cenário musical, inspirando gerações. “Somos velha guarda, não fazemos hits, fazemos clássicos”, declarou do palco.
O frentista Gerson Machado, de 28 anos, por exemplo, contou que ama o rap desde criança. “Aprendi logo cedo a curtir o MV Bill por influência dos meus primos e do meu irmão. Eu acho que todo mundo deveria ouvir, porque as músicas dele mostram como a vida na quebrada. A mídia e as outras classes não passam como realmente é, e ele, de algum modo, consegue mandar para a gente como as coisas acontecem”, afirmou.
A funcionária pública Palone Antúnia, que trouxe os filhos de 17 e 18 anos para curtirem o evento, contou que essa foi a primeira vez que assistiu a um show de rap. “Ouvia rap com meu irmão em casa e hoje escuto com meus filhos, mas nunca tinha visto ao vivo. As pessoas precisam quebrar o preconceito. Quem se aprofunda nas letras consegue entender muita coisa da realidade, do passado, falta só tentarem compreender”, pontuou.
Legado – A rapper Kmilla CDD, irmã de MV Bill, dividiu com ele o palco e os vocais durante o Campão Cultural e fez toda a diferença no espetáculo. Além de atuar no backing vocal, ela “enfrentou” o cantor em versos em alguns pontos do show, especialmente em Estilo Vagabundo, uma gravação que fez sucesso e gerou uma sequência de composições, mostrando uma verdadeira DR entre homem e mulher. A série, que já chegou ao seu quinto desdobramento, representa uma longa batalha conjugal.
Kmilla, além de ser parceira frequente da produção do irmão, tem um álbum próprio chamado Preta Cabulosa. Ela contou que começou a fazer rap inspirada em diversas vozes femininas como Dina Di, Negra Li, Rubia Fraga do RPW e Cris SNJ. “Elas pavimentaram o caminho para mim e hoje quando faço minhas letras, faço pensando na nova geração, para que o público que curte meu trabalho possa dar continuidade a esse processo”, explicou.
MV Bill também falou sobre a arte do rap como um legado: “Não é consciente, é involuntário, mas em muitos shows que temos feito encontramos pais que levam os filhos, filhos que assistem aos shows e contam que foram os pais que apresentaram o rap. Hoje já falamos com uma geração diferente e muito disso foi através dos pais.”
Apesar das gerações terem passado, no entanto, o rapper acrescentou que as mensagens de suas letras escritas há duas décadas passadas ainda são atuais. “O Brasil é tão repetitivo que músicas nossas continuam fazendo sentido. Nosso sonho é que uma música como ‘Só Deus Pode me Julgar’, por exemplo, deixasse de fazer sentido, mas cada verso cabe muito hoje e vai continuar cabendo nos próximos anos”, comentou. Para reverter a situação, MV Bill diz que a solução é ir usando a arte e a cultura como formas de modificação. “A gente torce para que essa chave seja virada”, finalizou.
O Campão Cultural chegou à sua reta final. Confira o que mais vai rolar no festival clicando aqui.
texto: Evelise Couto
fotos: Álvaro Herculano